De novo Era uma vez

Devagar, sem que as pessoas pudessem perceber, os contos de fadas voltaram com tudo para os livros, para o cinema e para a vida das antigas e novas crianças. 

É difícil saber quem e quando começou o resgate às princesas, príncipes, garotas de chapéus vermelhos, cachos dourados, moças comedoras de maçãs e casas feitas de doces. O fato é que eles estão em todos os lugares.

Um ótimo exemplo literário neste assunto é Raphael Draccon, autor da série Dragões de Éter. O primeiro livro, lançado em 2007, fala sobre a caçada às bruxas em um reino do Éter, e os protagonistas desta história são ninguém mais ninguém menos que Chapeuzinho Vermelho, João e Maria, Branca de Neve, Mestre Zangado, dos sete anões, Capitão Gancho e o crocodilo obcecado da Terra do Nunca. 

Confesso que é um tanto incômodo, para quem não está acostumado, ter um narrador tentando interagir com você o tempo todo. Contudo, ao avançar alguns capítulos e perceber que Draccon resgatou os contos de fadas que eu ouvi, inúmeras vezes quando criança, na minha escolhinha (por sinal, chamada Chapeuzinho Vermelho), sai andando pela casa e contando a novidade a todos da minha família. É, leitores compulsivos pagam mico às vezes. Só às vezes.

Depois de resolver meu preconceito por narradores abelhudos e palpiteiros, compreendi que este estilo do autor é, se não original, autêntico. Ele conseguiu estabelecer uma narração no ritmo do pensamento, assim como fez, com muito sucesso, Clarice Lispector. Ademais, fiquei absurdamente impressionada com as analogias feitas sobre as fábulas. É claro que sempre existiu “a moral da história”, porém, é diferente ver a moral inclusa na história tão belamente conectada. E foi com a seguinte analogia que Draccon me conquistou:

“E foi então que as balas de chumbo acertaram o corpo, abrindo dois rombos no peito do bicho do tamanho de um joelho. O corpo espirrou sangue, rubro como o de um homem [...]. E foi quando o sangue do lobo banhou ainda mais o chapéu pálido da criança.

“E o branco se tornou vermelho” 

Me sinto orgulhosa quando vejo autores brasileiros tão talentosos e corajosos. Digo isso porque o mercado editorial brasileiro não é o mais receptivo para quem quer se inaugurar. Há editoras que não aceitam mais livros de autores brasileiros que tentem a sorte de terem a publicação comprada por elas, publicam apenas livros que já fazem sucesso nos EUA e na Europa. 

A trilogia de Draccon continua com “Corações de Neve” e  “Círculos de Chuva”, já lançados pela editora LeYa. E se vocês gostaram da volta dos personagens fabulosos, será lançado este ano o filme “Branca de Neve e o Caçador”, com a atriz Kristen Stewart, “Espelho, espelho meu”, também sobre a Branca de Neve, com a atriz Julia Roberts. Isso, sem contar a série “Once Upon a Time”, trazendo Branca de Neve e os Sete Anões para o século XXI, que será exibida hoje, pela primeira vez, no canal Sony, às 21h.